sexta-feira, 27 de março de 2009

Lápis de cor





Um dia, te levo, amor...
Ao lugar da nossa infancia,
Onde está o lapis de cor
Que desenhei com constância,
Pra ti uma linda flor...
E que tu, com certa implicância,
Não deu nenhuma importância
Pro meu desenho... Que dor!

quarta-feira, 18 de março de 2009

Luz


Quem me dera um dia ter valores
Como os crentes que rogam só piedade
Sou infame, tenho as maiores dores:
Chagas que vem sangrando essa saudade

Um dia hei de ter meu valor
Construído sobre meu medo, meu fado,
Alentado pelas mágoas que guardei do amor
Que me matou com rosas, punhais de veludo.

E não há certezas nessa vida,
Não há remédio que cure essa ferida
Despi-me dos véus, das máscaras, da dor.

Entreguei-me de corpo e alma em ardor
Desgracei minha vida, perdi meus valores...
Tento reconstruí-los, mas a luz lembra as dores.




terça-feira, 3 de março de 2009

Íntimo




Ando por descalças ruas
Sob fria chuva de outono
Entregando-me ao abandono
Das lembranças que eram suas

Colhendo quimeras cruas
Em jardins vazios, sem dono
Bebendo dor do sulco ao pomo
Tatuando flor em pernas nuas

Suspiro aos sabores do vento
Palavras de prece sentida
Segredos por mim inconfessos

Gotejando o incansável lamento
Que trago na carne ferida
Da crua angústia dos versos

quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009

Ultimo suspiro


Fiapo de vida
Fio de teia
Esticado
Ando... Ando...
Rompendo.

Espelhos enxugam lágrimas
Em meus olhos vejo
Sorriso salgado.
Fiapo de vida,
Fio de teia.
Três cegas, um olho
Tesoura, sangue, veia
Corre ...........(tum, tum, tum)
Descompassado....(tum, tum)
Jorra apressado..(tum)
Esvaziando... calado
Aos poucos desfaz
Fio de vida
Um corte
Olhos
fec
ch
ad
o
s
.
.
.



quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009

Silêncio


Um silêncio que sufoca
Que agride e incomoda
Turvando o meu prazer

Um silêncio complacente
De uma mente delinqüente
Invadindo o meu ser

Um silêncio torturante
Que faz uso o militante
Nesta guerra do querer

Um silêncio arrogante
Tem nos olhos o meliante
Que me furta sem eu ter

Um silêncio provocado
Por um ódio mastigado
Que me fere sem saber

Um silêncio que escuta
Meus gritos de lamuria
Sem que nada possa fazer

Um silêncio que abriga
Os desejos de uma vida
Impedida de viver

Um silêncio não ouvisse
Se mil vezes surda fosse
Evitando mais sofrer...


terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Parte da chuva

Perseguição, ou resposta de Deus?
Injustiça, ou vingança dos céus?
Quem é que sabe porque só chove
Na cabeça de quem ainda não sabe?
Ei, cuidado com a chuva!
Mas se a chuva não chove tudo,
continua sendo chuva?
Aqui fora continua seco,
mas lá dentro tudo se molha.
Chove?
Não abra o guarda-chuva,
a chuva está guardada pra você.
Vê? Não chove pra mim.
Mas pode chover se pagar pra ver.
Não entende?
Ok, abra o guarda-chuva.
Mas cuidado!
Pode se molhar com a chuva
guardada pra você.
Só pra você. 
Foto: Dirceu Garcia

sábado, 24 de janeiro de 2009

Suspíria


Minha alma absorta e muda
Se encerra num pequeno aquário
Num poço frio, imaginário
Que em lágrimas de dor afunda

Suspiros de torpor que inunda
Meu corpo preso em um sudário
Retalhos de um mesmo cenário
Que em palma da minha mão abunda

A dor que brota em minha pele
Reflete o meu silêncio surdo
E minha palidez mortuária

Pedaços que em você compele
Num breve devaneio, em surto
Da vida por um triz, precária.


segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Exatamente




I


Perdi a tarefa de respirar, hoje, pela manhã
Era o fado.
Era um simples esquecimento e um leve afogamento
Mas sabia que o rearranjo dos átomos sem vida
Que habitam o universo desde o princípio
Fizera-me perder a tarefa de respirar hoje, de manhã.

Quinze bilhões de anos de ficar sem respirar hoje.
O amanhã ignorado, se o soubesse ler
Já o veria escrito hoje
Como encontro o passado anotado nas coisas.
Exatamente igual
E exatamente igual a conhecer os nomes dos antepassados.

Era um destino sem Deus
Que me fazia afogar, hoje de manhã.
Era eu sozinho à mercê do fado verdadeiro
De pé, aos pés de sua esteira (infinita?).

Ah! Quisera conhecer os sinais para prever o Niágara
Exatamente como se adivinha as órbitas dos planetas.




II

Depois de amanhã estarei feliz.
Talvez contribua de alguma forma inesperada
Eu, para a minha própria felicidade.
Chamaria a isso de controle.
Pegaria as rédeas da minha vida com as mãos
E, cidadão do mundo que sou, possuiria a vida
A minha vida
A única vida que me é dado possuir.

Chegaria cedo então ao barqueiro
E diria Quero atravessar o rio nesse ponto
Exatamente.

Teria as rédeas de minha vida nas mãos
Mas para isso não basta querer
Gostaria de saber exatamente a data da travessia
E assim saberia também a data de antecipar:
Não posso cair, por engano num desses mecanismos
Que são utilizados pela Vida para nos enganar
E de fazer simular contingências
Essa enorme impressão de livre-arbítrio
Em que nada se desvia de seu curso
A não ser quando o desvio é o próprio curso.
A fina impressão de escolha.

Foto: Dirceu Garcia
Texto: Tarlei Melo

quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

Tamanho



O meu sentimento não cabe num poema

Ele incha e machuca tentando chorar
porque não cabe nos olhos
Nem no meu peito se assenta! 
Invade as vizinhanças, pulmões, baço
tripas

O meu sentimento não cabe em mim

Nem em minha casa
onde expande, arromba as janelas 
estraga o portão
Tampouco o tempo o contém
Não coube num ano, e tende a preencher
outros tantos
sem estar confortável

O meu sentimento não cabe no mundo

Carecia mais espaço!
Um deserto, um oceano
todo o planeta
Talvez caiba na Lua! E então ela ficaria
rubra - não de vergonha
mas de esforço inútil 
em comportá-lo adequadamente

E cá no chão os homens não notariam sua rósea agitação.


Foto: Dirceu Garcia
Texto: Lilian Avelar

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Cinza






Traz de volta o sol

Não mais viva, sou.
Agora tudo tão cinza, insosso.
Lagrimas escorrem pelo pára-brisa
(sentindo o cheiro,
teus cachos em meus dedos)

Traz de volta o sorriso
Não mais alegre, estou.
Agora tudo tão quieto, calado.
Perdida na chuva lá fora
(sentindo o gosto,
tua boca em meus lábios)

Traz de volta o calor
Não mais brasa, sinto
Agora tudo tão apático, gelado.
Correndo sozinha estrada afora.
(sentindo o frio,
teus braços a envolver-me)

E quando olho o retrovisor
Paisagem insensível, sem cor.
Percebo que pedaços ficaram pra trás
Olhares, afagos, cuidados,
Sem teu corpo, tanto faz.

Tudo tão cinza está.

Foto: Dirceu Garcia
Texto: Amanda Oliveira

domingo, 4 de janeiro de 2009

Rosas ao rosto






A solidão que sentia não era mais a mesma
Era doída... dilacerante.
Há muito deixara de ser saudosa.
Estava sórdida.
Saudade.
As paredes fabricadas de sonhos
Cresciam empoeiradas e sombrias
Não se via mais luz
Agora estava escuro, vazio.
Da cama escorria para a janela
E o que via era menos que paisagem
Via um ar gelado batendo-lhe a cara
Um crepúsculo lilás, fúnebre
E o sol que antes refletia seus cabelos
Agora estava frio, quase úmido
Como seus olhos cheios de lágrimas.
De música não se lembrava,
Ouvia sussurros, roucos...
Sua pele, pálida, estava fria
Quase congelada.
Congelante...
Da janela, única companhia de tristeza
A tentava, dias e dias, convidativa.
Suas portas abertas, como um abraço
Nela se refletia...
Até que um dia
Caía... 
Caía.


Foto: Dirceu Garcia
Texto: Karina Belmont